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Heróis supernormais, vem aí Kick Ass

14 de jun. de 2010

14-06-10
Hiperviolento e ultrapop, Kick-Ass inaugura uma nova era para os filmes de super-heróis
Isabela Boscov

Dave Lizewski não é atleta do time de futebol da escola nem gênio da matemática; não é popular, mas também não é um coitado torturado pelos colegas. É um menino comum sob a aflição banal de ser adolescente. Dave, porém, acha que há uma cura para esse mal: com uma roupa de mergulho verde encomendada pela internet e dois bastões presos às costas, mais um pouco de treino (basicamente, poses intimidadoras praticadas diante do espelho), crê, ele pode virar Kick-Ass, super-herói contra o crime em Nova York. Dave não é idiota. Ele apenas lê quadrinhos. E os quadrinhos e os filmes baseados neles, como Homem-Aranha, X-Men e Batman, argumentam que é justamente das aflições íntimas que nascem os superpoderes ou, na ausência destes, a superdeterminação.

PEQUENA E LETAL
A extraordinária Chloë Grace Moretz como Hit-Girl: treinada pelo próprio pai para ser uma máquina de matar
 
Como Kick-Ass, então, Dave tenta interromper um furto, e descobre a distância entre os planos e a sua realização. É espancado, esfaqueado e, em seguida, atropelado. Passa meses no hospital, e sai dele com placas de metal afixadas aos ossos e uma resposta diminuída à dor. E lá vai Dave, de novo, com seu traje de neoprene e seus bastões, enfrentar um bando de marginais. Não só se sai um pouco melhor do que antes, como é filmado em ação por uma meia dúzia de celulares. Em questão de horas, portanto, é um herói no YouTube – e da nação. Kick-Ass – Quebrando Tudo (Kick-Ass, Estados Unidos/Inglaterra, 2010), que estreia no país na sexta-feira, não é uma bobagem. Da mesma forma que seu protagonista, o filme do diretor inglês Matthew Vaughn (do incisivo Nem Tudo É o que Parece, com Daniel Craig) se impõe uma missão – a de testar hipóteses sobre os sentimentos de vulnerabilidade e impotência que propiciam o culto aos super-heróis. Kick-Ass é hiperviolento, hiper-realista e tão transgressivo, na sua manipulação da cultura pop, quanto Pulp Fiction o foi em seu tempo. E é também capaz, quando menos se espera, de provocar emoção e choque genuínos.


A excelente performance do inglês Aaron Johnson como Dave é o que costura o filme; mas a carga de choque e emoção vem de dois outros personagens. Na primeira cena em que eles são vistos, Mindy, de 11 anos, veste um casaquinho branco e, com os olhos franzidos contra o sol, espera que seu pai dispare uma pistola 45 contra ela. "Você mal vai ter tempo de sentir alguma coisa, querida", diz ele. Mindy leva o tiro no peito, levanta-se – e leva mais dois. Trata-se de uma aula: Mindy veste um colete à prova de balas e está sendo ensinada a resistir à dor e ao medo. Damon, seu pai, é um louco que mantém em casa um arsenal e treina a filha para ser uma máquina de matar. Mas, graças aos desempenhos estupendos de Nicolas Cage e Chloë Grace Moretz, essa relação tão estranha transborda ternura, alegria e sentimentos mútuos de proteção. Da mesma forma que o encanto de John Travolta por Uma Thurman, em Pulp Fiction, a devoção entre pai e filha é o elemento que propulsiona Kick-Ass, e que o diretor Vaughn ressalta acima de todos os outros em sua adaptação do quadrinho homônimo lançado há dois anos. (Vaughn, aliás, levantou sozinho os 30 milhões de dólares do filme, o que explica como um material tão subversivo chegou intacto à tela.)

Assim como Dave, pai e filha vivem a fantasia de ser super-heróis: de noite, ele enverga uma capa preta e ela esconde as marias-chiquinhas sob uma peruca roxa, transformando-se em Big Daddy e Hit-Girl. Mas, ao contrário de Kick-Ass, eles são o artigo legítimo – em especial Hit-Girl. É horrível ver uma menina, e tão cheia de brilho quanto Chloë Grace Moretz, mutilando e chacinando homens adultos ou apanhando deles brutalmente. Mas o choque maior é outro – é constatar que a violência da garota é, na verdade, uma declaração de amor a seu pai. Em Kick-Ass não há mães, apenas pais. Todos eles tentam proporcionar alguma segurança aos seus filhos, e todos falham. É por causa de outro pai equivocado, o traficante Frank (Mark Strong), que o filme se encaminha para uma conflagração: Frank persegue o trio fantasiado por causa dos prejuízos que eles causam aos seus negócios – e seu filho (Christopher Mintz-Plasse, o desajeitado McLovin de Superbad) infiltra-se entre os heróis, sob o nome de Red Mist, para impressioná-lo. No fim, depois de profusa e acachapante violência, os sobreviventes jurarão retomar sua missão de honrar e proteger as pessoas queridas. Mais violência certamente se seguirá. Assim como um Kick-Ass 2, que terá uma missão ainda mais difícil que a dos personagens: a de continuar, sem desvirtuar, uma criação tão original quanto esta.
 

da Revista Veja

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